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sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Crônicas De Um Miserável (uma sexta-feira agradabilíssima - parte dois)

Ah, mas sessenta minutos de intervalo não passam de uma miséria - como, eu lhes pergunto, como se é possível satisfazer todas as necessidades de um simples e ordinário homem em tão pouco tempo? E o direito à sesta, senhores, onde fica? Quinhentas mil e uma maldições, o inferno aguarda por vossas malquistas almas - todos vós, detentores do poder! Tão somente duas classes cultivam certas regalias: os fidalgos e os descabidos. E ainda que eu ostente pretensões a ambas, bem, este não é momento para semelhante vislumbre; afinal todos esses meus sessenta minutos, um por um, já se encontram esvaídos. Mas, não obstante, continuar é preciso, é preciso! Com o quê, sabe-se lá... Ah!, sim, sim, a história... A curiosa história daquela fagueira senhorinha, assim como o desenrolar de minha sexta-feira agradabilíssima. Sem mais nem mais - continuemos, continuemos!
A tarde ocorreu tranquila, contradizendo toda a expectativa, ainda que vã, minuciosamente elaborada pela manhã (e durante a noite anterior, por que não?) já exaurida; óbvio, para tudo isso se possui um bom motivo: um intrigante par de pernas - digo, senhores, uma mente brilhante e um semblante simpaticíssimo. Meus caros colegas de repartição já não faziam mais nada além de exercer o papel da insignificância. E assim fui coroado com breves e fugazes quatro horas esvoaçantes de labuta naquela sexta-feira.
Mas, não obstante, esperanças não havia - aprendera a sobreviver isento de ilusões. Embora a imagem de minha ilustre e oportuna cliente permanecesse feito véspera de feriado em minhas irrelevantes lembranças, a opção primeira e mais prudente para minha condição era a exímia arte do macaqueado equestre - em outras palavras, fingir-se de égua. E foi esta justamente a conduta de meu comportamento agudo, ao longo dos minutos finais daquela tarde; instantes precedentes do soar libertador das dezessete horas, chamadas instigadoras brotavam tal qual chuva de verão em meu aparelho celular...
- Oh, miserável! O que vamos fazer, digo, beber hoje à noite?
- Seu tunante irremediável, antro de defectibilidades, qual é?, o mesmo bar da última semana?
- Mas, pois, sem desculpas dessa vez, pague-me sua dívida ou conto para minha irmã aquele nosso pequeno segredinho... Pague-me em uísque, sem mais nem mais!
Ah, meus amigos... Numa palavra, meus amigos são tão - como se diz? - criativos e imprevisíveis... Ora, mas que diabos se faz numa sexta-feira além de se embriagar? Fiquemos bêbados, eu também lhes afirmo - a comunhão de fato se é concebida tão somente num estado pleno de ebriedade, quá-quá-quá!
Pois bem - antes de me enveredar em mesas de bares noite adentro, uma breve e necessária ida em casa; banho, roupas limpas etc. Antes disso, uma cervejinha, apenas uma cervejinha!... Afinal, tenho nada mais a fazer - a pensar, bem, tal estado completo de ausência de atividades se torna impossível. Contas, futebol, dívidas, mulheres, crises existenciais, mulheres, idade avançada, parcos vencimentos, mulheres, o sentido da vida, aquela senhorinha... Aquela senhorinha de olhar arredio, e narizes empinados! “Está decidido: uma cervejinha tão somente e depois irei para casa.”
Companheiros para tal intuito existem aos montes - se ainda assim, em casos de extrema infelicidade, esses se encontrarem em falta, basta sentar-se em soledade e oferecer uma rodada livre. Abutres e bebedores compulsivos se prontificam com um estalar de dedos - e um abrir de carteiras, eh eh eh! Mas, não obstante, antes mesmo de qualquer percepção de minha parte, ao penetrar no recinto costumeiro das sextas-feiras às dezoito horas e pouco, já fora identificado por alguns destes companheiros...
- Mais uma cadeira, garçom!... Nosso maldito contador de anedotas veio rezar em nosso culto hoje!
- Apenas uma cervejinha, irmãos! - digo eu; ora, pois, ajoelhou-se, há de rezar, quá-quá-quá! - Preciso despir-me de toda a imundície do cotidiano e me purificar nas benditas águas termais da tecnologia da eletricidade, ainda que a obrigatoriedade do pagamento em dinheiro por tais seja notória, é bem verdade...
- Quem é este? Um pastor forasteiro?... - havia pessoas inéditas para mim naquela mesa; para meu infortúnio, nada de interessante. Também pudera, não estava presente, dentre as minhas intenções e expectativas para aquele local, encontrar misses ou artistas; apenas gente comum, miserável, assim como eu. Ótimo, senhores, ótimo!...
Após a minha cerveja planejada - na verdade foram três, mas, no entanto, quem de fato esperava que eu cumprisse ao pé da letra semelhante e única promessa? - fui-me assear em casa. As horas ainda eram poucas; uma noite agradabilíssima era anunciada. Súbito, meu celular começara a funcionar novamente - era uma chamada. Um chamada, senhores!, e adivinhem de quem? A pessoa mais improvável a ostentar tal intenção naquela noite de sexta-feira - nem tanto, admito; não se trata de meu objetivo elevá-la a um pedestal de mármore, tampouco vesti-la sob fios de ouro. Sim, senhores, senhores meus... Aquele número piscando freneticamente diante dos olhos deste inconveniente narrador pertencia àquela senhorinha - à minha senhorinha, digo, mui formosa cliente. Volto a afirmar: por uma horda e meia de diabos mal-cuidados, mas que noite, que noite agradabilíssima!
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Um esclarecimento. Felicidades são momentos; vivemos afirmando que somos felizes, mas não o somos. Juramos felicidades a pessoas que detém nossa admiração, porém sabemos no fundo que tal promessa é injusta. Momentos não passam de momentos - unicidades. Gastamos uma semana inteira! lamentando e praguejando, para finalmente em um dia, uma noite - ou uma ligação, tão somente uma ligação... -, explodirmos em um êxtase inexplicável. Isto, senhores, isto é a felicidade! Algo improvável, imune a quaisquer prescrições. E, nada mais compreensível, em momentos assim agimos feito infantes - precoces. Afinal, dias, meses, semanas - e por que não anos e existências? - presenciando ordinariedades e frustrações nos levam a tal comportamento igualmente inesperado. “É próprio da dor fazer reaparecer o lado criança do homem.” - está aí uma frase justificável. Portanto, não julguem as patacoadas inefáveis que tomarão nota daqui em diante; trata-se de infantilidades, nada mais que isso. Eis, pois, o ocorrido.

2 comentários:

Natália disse...

HAHAHAHAHA
ADOREEI O CONTO AN, super engraçado!
Esse bar ai tá que tá! HAHA

Parabéns querido ;)
Mais um conto digno de ser aplaudido de pé :D

beeeijos

Natália

Unknown disse...

Haaaaa, esse veio com uma dose a mais de malícia, einh? hahahahaha As pequenas observações sobre as pessoas, o ambiente, a razão pela qual tomamos certas atitudes foram muito pertinentes! Sobre os abutres que nos cercam quando abrimos a carteira, então, foi genial! E o quanto o final pegou de surpresa? Ah, aquela parte final, quando você falou sobre felicidade, é aquilo justamente o que penso. Felicidade são momentos, como aquele em que o telefone tocou. Só estamos felizes quando surpreendidos, ou envolvidos em alguma emoção causada por situaçoes específicas. Momentos, momentos, momentos... Como sinto falta dessas surpresas, tal qual a vivida pelo nosso conheciiiido miserável! Hahahahaha, que final, Sony! O que gosto nos seus textos é isso, você passa um tempão sem escrever, mas quando volta à ativa, Deus nos segure!!!